30 de out. de 2012

VII Rodada Latino-Americana


O Laboratório de Estudos da América Latina - LEALConvida para a 

VII Rodada Latino-Americana :


“Defesa Nacional, Política Migratória e Geopolítica da Economia Internacional.”



10 de Dezembro de 2012

14h30 

Auditório da Escola do Serviço Social 

Praia Vermelha UFRJ



Vágner Camilo Alves (Prof. RI-UFF)
“Estratégia Nacional de Defesa na História do Brasil.”

Sabrina Medeiros (Profa. RI-EGN)
“Defesa, Gestão e Fronteiras”

Flávia Guerra (Profa. RI-UFRJ)
"A política migratória brasileira no século XXI: nova abordagem ou velhos paradigmas?”

Maurício Metri (Prof. RI-UFRJ)
“Os reflexos geopolíticos da economia internacional sobre a América Latina.”


E também  :
  
Lançamento do Livro na UFRJ:

“Relações Internacionais: Evolução e Teorias da Ciência do Mundo” (Editora Gramma)

Marcelo Coutinho (Prof. RI-UFRJ)  



Contamos com a sua presença!


Observações:

  1. Serão entregues certificados de presença para os ouvintes
  2. Não é necessária a inscrição
  3. Qualquer dúvida, envie um email para: lealufrj@gmail.com

18 de mai. de 2012

Artigo: "Malvinas-Falklands: o impasse no conceito de soberania"



A seguir, o quinto artigo do blog, que pode ser encontrado na aba "Publicações" do menu acima.

Lembramos que o conteúdo dos artigos é de responsabilidade de seus autores. O Leal não se responsabiliza, assim, pelo conteúdo dos mesmos.

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Malvinas-Falklands: o impasse no conceito de soberania.

Flávia Guerra Cavalcanti (UFRJ)


1. Introdução:

     A recente comemoração na Argentina dos 30 anos da Guerra das Malvinas/Falklands significou a culminância de um processo que vinha ocorrendo desde o início do período Kirchner: a reabertura da discussão sobre a soberania das Malvinas. Os debates mostraram que o assunto "Malvinas" constitui-se como uma questão de política de Estado para os argentinos. Pelo menos esta foi a explicação da presidente Cristina Kirchner para justificar um posicionamento semelhante ao dos militares que empreenderam a Guerra de 1982 pelo controle sobre as Malvinas. Os métodos agora seriam diferentes. Em vez da guerra, a Argentina optaria pelo diálogo com o Reino Unido. Em suma, entre os militares e o governo de Cristina Kirchner haveria uma comunhão de objetivos - a retomada das Malvinas - e uma discrepância nos métodos - guerra e diálogo, respectivamente.  
     Desta forma, as Malvinas pairam como um tabu inquestionável, algo que estaria para além de qualquer disputa entre direita e esquerda na Argentina. O nacionalismo diluiria as diferenças entre forças políticas, permitindo a união contra um "outro" externo. Ademais do nacionalismo, o discurso kirchenerista sobre as Malvinas inclui elementos como a soberania, o colonialismo, a militarização do Atlântico Sul e o direito sobre os recursos naturais da região.
     O Reino Unido reagiu com o argumento da autodeterminação dos povos, acusando a Argentina de colonialismo. Como apontaram muitos, é completamente despropositado o Reino Unido, um ex-poder imperalista, atribuir à Argentina intenções colonialistas. Por outro lado, recorrer à autodeterminação parece ter sido uma decisão que favorece a reivindicação inglesa, haja vista que o princípio permanece como um dos mais naturalizados do discurso moderno sobre a soberania. Quem ousaria contestar o princípio da autodeterminação dos povos?
     Tanto de um lado quanto de outro, percebemos a permanência de discursos ligados à soberania estatal. O impasse ocorre justamente em torno deste conceito, considerado como inegociável por ambas as partes. Neste artigo, pretendemos discutir as contradições presentes nos discursos de ambos os lados quando utilizam o conceito de soberania e o relacionam a determinados pontos de vista. O que é mobilizado quando se fala de soberania? Será que a sugestão de Ban Ki-Moon de uma “solução criativa” para a disputa pelas Malvinas/Falklands pode ser pensada dentro dos marcos do pensamento político moderno e da noção tradicional de soberania ?
    
2. Repensando a soberania

     A crítica pós-estruturalista propõe um estudo da soberania como prática discursiva e não como uma realidade objetiva. Portanto, neste marco teórico, a pergunta não é sobre o que é a soberania, mas como ela é representada em nossos discursos. Não podemos entender a soberania em sua essência ou “tal como ela se apresenta na realidade”, mas apenas a partir do discurso e da prática que usamos quando a ela nos referimos. Isto significa que a soberania é uma prática histórica em construção e não uma entidade a-histórica. Ela não existe como algo anterior às nossas práticas discursivas.
     Na definição tradicional, aprendemos que “a soberania é o locus classicus do Estado, o sine qua non da vida política” (ELSHTAIN, 29, p.XIII). A soberania é o local a partir do qual começamos a estudar política, com Jean Bodin, Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau. O conceito de soberania é assim visto, desde as primeiras aulas de teoria política, como algo que deve ser aceito e não questionado.
     A narrativa histórica da soberania estatal apresenta-a como o momento de libertação dos arcaísmos e irracionalismos da Idade Média. Consequentemente, a soberania é resultado de “uma narrativa heroica” (Idem, p. 91), do triunfo da razão sobre o clericalismo. Com a destruição da ordem feudal, a soberania passou a ser associada a uma noção de “exclusividade territorial”. Não era mais possível pensar em múltiplas soberanias, a do Papa, a do Rei ou a dos senhores feudais. O poder se tornou monista, concentrado numa única figura, a do Soberano estatal.
     A partir de pontos de vista diferentes, Locke e Rousseau defenderam que a autoridade soberana reside no povo. Esta formulação embasou a construção do Estado nação no século XIX; o Estado começou a ser associado a uma nação e esta a um povo. Portanto, a soberania não dependeria apenas da definição do território, mas teria de ser pensada também como a prerrogativa de uma população.
No século XX, o princípio de autodeterminação, introduzido por Woodrow Wilson em 1918, reforçou a relação entre etnia, soberania e Estado. A ideia de que cada etnia deveria ter direito à soberania levou à interpretação de que seria legítimo cada etnia possuir seu próprio Estado. Para minorias cujos direitos são desrespeitados, a soberania permanece um objetivo sagrado.
     Segundo Elshtain, a soberania preserva o caráter monista da figura divina;  a secularização promovida pelo Estado soberano mantém implícita uma relação com a teologia. Parte da divindade que sustentava os reis foi transferida para o Estado moderno. Consequentemente, ocorreu uma deificação dos mecanismos estatais. É verdade que a teoria de Locke apresenta possibilidades de um Estado constitucional e limitado, garantidor das liberdades individuais, mas tais garantias constitucionais não são suficientes para retirar da soberania sua aura sagrada.
     O questionamento pós-estruturalista sobre a soberania realiza o que Giorgio Agamben chamou de profanação, isto é, trazer ao debate público aquilo que havia sido isolado no campo do sagrado. Voltar a questionar os mitos que sustentam a vida política, traçando sua genealogia e revelando seu caráter contingente e histórico.   
     Robert Walker é um dos autores que investiga a soberania estatal como prática discursiva. Segundo ele, as teorias de relações internacionais não são explicações do que existe na política internacional, mas produtoras e reprodutoras do significado de soberania. Em outras palavras, as relações internacionais são uma prática que reproduz a soberania estatal ao mesmo tempo em que a soberania estatal cria as condições de possibilidade para a disciplina de relações internacionais.
     A soberania é uma resolução moderna para a tensão entre universalidade e particularidade. Na Idade Média, esta tensão já existia, mas foi resolvida por meio da hierarquia entre diversos níveis de poder. Ao contrário, a resolução moderna para aquela dicotomia é a soberania. Esta resolução é espacial na medida em que confina uma identidade política dentro de uma fronteira territorial exclusiva. Supõe-se que, dentro do Estado, o bom e o verdadeiro possam ser alcançados. No entanto, estes universais só podem ser obtidos dentro de comunidades particularistas, os Estados. A política só pode ocorrer dentro do Estado soberano.
     A soberania responde a questões como “quem somos?” ou “de onde viemos?”. A história de uma comunidade é frequentemente associada ao que acontece dentro de um território delimitado e soberano. Assim pode-se estabelecer o vínculo entre os cidadãos e o Estado soberano ao qual pertencem.
     Em contraste, no outside existe uma ausência de autoridade e comunidade, ou ainda, uma ausência de soberania. No discurso dominante das relações internacionais, o outside é o espaço da anarquia e da insegurança. E o outro, situado no espaço exterior, assume a forma do inimigo que precisa ser excluído. Ou seja, os princípios éticos só são aplicáveis dentro do Estado soberano.
     Porém, segundo Walker, a soberania também teria uma dimensão temporal. Os princípios universais são realizados dentro do Estado e é apenas aí que podemos falar em progresso, desenvolvimento e política. A soberania contém uma dimensão temporal pois somente no seu âmbito podemos falar de uma concepção de história como progresso. 
     Na oposição hierárquica entre dentro e fora, a soberania, localizada dentro do Estado, é o termo privilegiado enquanto a anarquia internacional, situada fora do Estado, se apresenta como mera negação da soberania. Disto decorre que o inside (a soberania) funciona com um modelo para o outside, como se fosse possível reproduzir no nível internacional os mesmos princípios que embasam a soberania. Em suma, a teorização sobre o internacional acaba limitada pelas concepções gestadas ao longo de cinco séculos no espaço nacional. Mesmo aqueles que pretendem pensar uma comunidade internacional o fazem tendo em mente a analogia doméstica. 
     O desafio, para o qual Walker, diga-se de passagem, não apresenta uma solução, seria pensar alternativas, soluções criativas que não sejam meras reproduções da prática discursiva da soberania.

3. O discurso argentino sobre a soberania das Malvinas.

     A Argentina lembra que as ilhas Malvinas eram parte de seu território em 1810, ano de sua independência da Espanha. Em 1823, os argentinos instalaram um govenador nas ilhas e, em 1829, uma guarnição militar, consolidando sua soberania sobre o território malvinense. No contexto do século XIX, o imperalismo inglês procurava obter o controle do Atlântico Sul para assegurar seu domínio sobre os mares. A conquista das Malvinas em 1833 pelos ingleses configura-se, portanto, como uma ação imperialista e colonialista.
     Em relação aos fatos do século XIX não há qualquer contestação possível, inclusive por parte do Reino Unido. O debate se dá em torno da utilização do argumento da anterioridade na ocupação do território. Para os britânicos, a anterioridade não poderia ser justificativa para a soberania atual, pois neste caso o discurso israelense sobre a Terra Prometida enfraqueceria o direito dos palestinos sobre a Palestina, assim como o de diversos outros povos sobre o seu território. Em vez da anterioridade, os britânicos invocam o tempo de posse sobre o território. De acordo com este raciocínio, os britânicos ocupam as Malvinas por mais tempo, o que levou à formação de uma população identificada com sua cultura. Ou seja, eles apresentam aos argentinos um fato consumado: por mais que esteja correta a avaliação sobre o colonialismo britânico e a invasão das Malvinas em 1833, isto não muda o fato de que hoje a maioria da população das Malvinas quer manter sua identidade e nacionalidade britânica.
     Ambos os lados invocam a soberania, mas interpretam-na segundo concepções temporais diferentes. Os argentinos recorrem ao conceito de soberania como “anterioridade”; o passado da soberania argentina sobre as Malvinas foi interrompido, mas esta ruptura não impede que esse passado exerça seus direitos sobre o presente. Ao contrário, os ingleses entendem que a soberania é definida como “tempo de posse”. Neste caso, o tempo passado se apresenta em continuidade com o presente, os britânicos teriam sido soberanos ininterruptamente, de 1833 até a contemporaneidade. Em relação à dimensão espacial, ambos concordam: a soberania significa exclusividade territorial. O compartilhamento da soberania sobre as Malvinas não parece ser, até o momento, uma hipótese para qualquer um dos lados.
     A reivindicação argentina sobre as ilhas ganhou um caráter de urgência no governo de Cristina Kirchner devido ao anúncio do Reino Unido sobre o início da exploração de petróleo nas Malvinas. Muitos analistas apontam esta política como apenas uma parte de um projeto maior de domínio geopolítico do Atlântico Sul pelos Estados Unidos e aliados.  
Segundo Rina Bertaccini, em 1980, o governo norte-americano publicou um documento intitulado “Free Oceans Plan” (Plano para o Oceano Livre), no qual se afirma precisar “contar com o apoio da Grã-Bretanha (...) que deve ser nossa principal aliada na região, não só porque é nossa amiga confiável na ordem internacional, como porque ainda ocupa diversas ilhas do Atlântico Sul” (Free Oceans Plan, 1980). A estratégia geopolítica dos americanos para o Atlântico Sul passa hoje, assim como ocorrera com a Inglaterra no século XIX, pelas Malvinas.
     Desde o fim da Guerra de 1982, as Malvinas vêm sendo ocupadas por bases militares. Este fato, no entanto, adquire uma outra significação após o fim da Guerra Fria, quando a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) passa a agir como um poder militar global.  De acordo com Bertaccini, o enclave militar inglês nas Malvinas seria hoje uma das “bases de controle e espionagem da OTAN no planeta” (2012, p.3). Além disso, afirma Bertaccini, a base vem recebendo navios e aeronaves militares com armas nucleares, o que desrespeita a Resolução da ONU sobre o Atlântico Sul como zona de paz e cooperação. 
     O analista político argentino Carlos Alberto Pereyra Mele destaca que as Malvinas ocupam uma posição estratégica no Atlântico Sul pois, além de permitir um controle do tráfego marítimo entre os oceanos, o estreito de Drake e o de Magalhães, as ilhas “têm uma projeção muito especial sobre o último continente não explorado até agora, a Antártida” (MELE, 2010, p.2).
     Porém, o autor lembra que os interesses econômicos não podem ser separados da estratégia geopolítica de controle sobre o Atlântico Sul. A disputa pelas Malvinas, apesar de antiga, ganha nova dimensão por estar inserida num novo conflito mundial por recursos naturais que oporia, de um lado, os Estados Unidos, a União Europeia e o Japão, e de outro, os emergentes China, Rússia e Brasil.
     Outro elemento novo na disputa seria o apoio da Unasul, que não aceita a participação de países de fora da região em exercícios militares no Atlântico Sul. Para Gilberto Rodrigues, estamos diante da “maior estratégia de defesa coletiva contra a soberania britânica sobre as Malvinas/Falklands até agora vista” (ano, p.1). A presidente Cristina Kirchner recorreu ao latino-americanismo ao dizer que a disputa não é mais da Argentina, mas de toda a região. “As Malvinas têm deixado de ser uma causa dos argentinos para se transformar em uma causa latino-americana e global” (KIRCHNER, ano, p.).
     O enquadramento do tema Malvinas como um problema “latino-americano” e “global” revela as transformações por que vem passando a ordem internacional desde o fim da Guerra Fria. Questões antes restritas ao âmbito nacional começam a ser percebidas como regionais ou globais. Desta forma, as práticas discursivas que constituíam as Malvinas como um “problema nacional” são substituídas por outras que agora apresentam a disputa em torno das ilhas como um “problema regional e global”.
     De certa forma, a reformulação do problema Malvinas por Cristina Kirchner representa uma inovação em relação ao discurso da ditadura militar (1976-1983), que considerava a questão como estritamente nacional. No entanto, o conceito de soberania não é eliminado do discurso de Cristina Kirchner.  
     Pelo contrário, paralelamente ao apelo de Cristina à Unasul, mantém-se o discurso da soberania argentina sobre as Malvinas, expressa na frase “Las Malvinas son argentinas”. O verbo “ser”, utilizado no presente do indicativo, contribui para conferir ao enunciado um viés imperativo e monológico, impedindo qualquer manifestação de uma voz contrária. Pode-se dizer que as “malvinas são argentinas”, mas o “problema Malvinas é regional e global”.
     A configuração do problema Malvinas como regional e global não descarta a soberania. Trata-se de uma nação soberana (a Argentina) apoiada por outras nações soberanas da América Latina. A Unasul atua como uma organização regional baseada nos Estados; não há qualquer instância supraestatal em sua estrutura. Como mostrou Walker, temos dificuldade em falar sobre o regional e o global sem utilizarmos a resolução moderna da dicotomia universalidade/particularidade trazida pelo conceito de soberania.    
     A pergunta que poderíamos nos fazer é se a estratégia do governo de Cristina Kirchner de transformar o tema Malvinas num problema regional e global representa de fato uma inovação e, mais que isto, se aumenta as chances de sucesso da reivindicação argentina.      Suspeitamos que a resposta seja negativa, pois o enquadramento regional e global das Malvinas significa apenas um reforço da concepção tradicional de soberania. Há um aumento do número de Estados que defendem a mesma ideia e não uma mudança do argumento em torno da soberania.


4. O discurso britânico sobre a soberania das Falklands.
     Como já adiantamos em outra seção, os britânicos também baseiam seus argumentos sobre as Falklands no conceito tradicional de soberania, mas tentam enfatizar o vínculo entre a soberania e a autodeterminação do povo. A identidade dos kelpers (habitantes das Falklands) e seu desejo de manter a cidadania britânica são apresentados como justificativa para o controle britânico sobre as ilhas. Os kelpers têm o direito à soberania e os britânicos assumem a missão de resguardar esse direito. 
     Retoma-se aqui a associação, que começou a ser feita no século XIX e avançou no século XX, entre uma identidade e um Estado ou entre um povo e um Estado.  A tentativa de fazer coincidir Estado e etnia levou a intervenções e anexações de território no século passado. Um dos casos mais conhecidos do século XX é o dos Sudetos da Tchecoslováquia, que foram anexados por Hitler sob a justificativa de que a etnia alemã dos Sudetos tornava aquele território parte do Estado alemão. Ou seja, o princípio da autodeterminação dos povos acabou sendo utilizado para legitimar apropriações.
     Apesar dos exemplos históricos que mostram sua distorção ou instrumentalização, o princípio da autodeterminação continua a ser um dos mais almejados pelas minorias sem Estado. Por isso, o discurso britânico sobre a autonomia dos kelpers encontra ressonância na comunidade internacional. Torna-se então evidente e natural o raciocínio de que, se os kelpers querem ser cidadãos britânicos, então o território das Falklands deve permanecer sob soberania exclusivamente britânica.  
     Em fevereiro de 2012, um grupo de intelectuais argentinos liderado por Beatriz Sarlo assinou o documento “Malvinas, uma visão alternativa”, no qual defendem o respeito aos interesses e opiniões dos habitantes das Falklands. Em artigo para o jornal La Nación, Sarlo considera que não é possível chegar a uma solução se os argentinos não considerarem os kelpers como “sujeitos de direito”. O ponto chave do conflito seria a autodeterminação dos kelpers. Para Sarlo, os argentinos têm dificuldade de entender este ponto porque vêem as Malvinas como uma questão sagrada, um mito nacional que não pode ser contestado e paira acima das divisões entre esquerda e direita. A construção do mito estaria baseada na crença de que a identidade argentina está vinculada ao território das Malvinas. “É pobre uma identidade que se sustenta como identidade territorial” (SARLO, 2012, p.2).

5. Conclusão.
     A visão alternativa proposta por Sarlo e outros intelectuais argentinos não nos parece tão alternativa assim. No lugar de uma soberania argentina baseada na territorialidade, teríamos uma soberania britânica justificada pela identidade kelper vinculada à britânica. A alternativa não é inovadora nem propicia uma abertura do diálogo porque simplesmente reproduz o discurso sobre a soberania moderna de um outro ponto de vista. 
     Tanto argentinos quanto britânicos recorrem ao conceito de soberania, ainda que dêem ênfases diferentes a ele. Os argentinos entendem a soberania do ponto de vista geopolítico e territorial, enquanto os britânicos a associam ao princípio de autodeterminação. Conforme discutimos brevemente na seção teórica, estas interpretações de soberania surgiram em momentos diferentes e se sobrepuseram ao longo do tempo.
     Em entrevista ao jornal El País, Sarlo chega a admitir que não existe negociação possível quando os negociadores não estão dispostos a negociar nada. Para argentinos e britânicos, “a soberania é inegociável, como se dela dependesse a identidade nacional de ambas as nações” (SARLO, 2012, p.1). Neste caso, Sarlo reconhece que o problema não é apenas o mito argentino sobre as Malvinas, mas também a intransigência britânica de voltar a negociar. Para ambas as partes, a soberania é sagrada, algo que não poderia ser profanado numa negociação. 
     A estratégia argentina de vincular as Malvinas a uma nacionalidade (as “Malvinas são argentinas”) acaba se tornando contraproducente por estimular um reforço da identidade kelper. As duas partes, embora discordem quanto ao resultado, estão utilizando a mesma prática discursiva que associa a soberania à exclusividade territorial e a uma identidade específica. Dentro deste quadro de referência teórico, não há qualquer possibilidade de discussão sobre uma soberania compartilhada sobre as Malvinas/Falklands ou uma Argentina que incorporasse duas identidades: argentina e kelper. 

6. Bibliografia.

BERTACCINI, Rina. Atlântico Sul: do colonialismo do século XIX ao imperialismo do século 20. Correio da Cidadanial, 17/02/12. http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=6821:manchete170212&catid=34:manchete Acesso em: 12/05/12.
                       
_____________. Malvinas, imperialismo cultural e autodeterminação. Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz. Disponível em: http://cebrapaz.org.br/site/component/content/article/41-top-headlines/746-rina-bertaccini-malvinas-imperialismo-cultural-e-autodeterminacao-.html Acesso em: 12/05/12.

COLOMBO, Silvia. Uma alternativa para as Malvinas. Disponível em: http://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/author/scolombo/page/5/ Acesso em: 10/05/12.

ELSHTAIN, Jean Bethke. Sovereignty. God, State and Self. The Gifford Lectures. New York: Basic Books, 2008. 

KI-MOON, Ban. Secretário-geral da ONU pede “soluções criativas” para crise das Malvinas. Ansa, 25/02/10. Disponível em: http://www.band.com.br/noticias/mundo/noticia/?id=269634 Acesso em: 12/05/12.

MELE, Carlos Alberto Pereyra. Disputa das Malvinas coloca à prova unidade regional. 27/02/10. Disponível em:  http://www.band.com.br/noticias/mundo/noticia/?id=269997 Acesso em: 12/05/12.

RODRIGUES, Gilberto. Malvinas ou Falklands? 29/01/12. Disponível em: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_secao=9&id_noticia=174080 Acesso em: 12/05/12. 

SARLO, Beatriz. Fetichismo y ceguera en Argentina. El País, 27/02/12. Disponível em: http://internacional.elpais.com/internacional/2012/02/27/actualidad/1330371063_532326.html Acesso em: 12/05/12.

_______________.  Las Malvinas no puede ser una cuestión nacional sagrada.  La Nación. 24/02/12. Disponível em: http://www.lanacion.com.ar/1451264-beatriz-sarlo-las-malvinas-no-puede-ser-una-cuestion-nacional-sagrada Acesso em: 12/05/12.


________________. El patriotismo despótico. La Nación. 27/01/2012. Disponível em: http://www.lanacion.com.ar/1443722-el-patriotismo-despotico Acesso em: 10/05/12.

            WALKER, R. After the Globe/Before the World. London: Routledge, 2010.
____________. Inside/Outside: International Relations as Political Theory. Cambridge: Cambridge Studies in International Relations, 1993.








7 de abr. de 2012

VI Rodada Latino-Americana

VI Rodada Latino-Americana: "Entre novas e antigas potências mundiais”


03 de Maio (quinta-feira)

14h30

Auditório da Escola de Serviço Social

Praia Vermelha

UFRJ

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“Entre novas e antigas potências mundiais”

Coordenador: Marcelo Coutinho (UFRJ)


  1. "Aprendendo com quem fez: o que a institucionalização europeia tem a ensinar ao MERCOSUL?"
    Ana Paula Tostes (UERJ)

  2. "Brasil, Estados Unidos e América Latina: a relação triangular em tempos de novas geometrias globais"
    Maurício Santoro (FGV)

  3. "Os BRICS como atores do desenvolvimento: cooperação e concorrência".
    Adriana Abdenur (IRI-PUC/RIO e Brics Policy Center)

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Contamos com a sua presença!


Observações:
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